Jornal DIÁRIO DO NORDESTE
Segunda-feira - 21-07-1991
Fortaleza - Ceará - Brasil
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Preconceito é o principal entrave na doação de córneas


Foto do Jornal DIÁRIO DO NORDESTE
Segundo Waldo, nenhum Banco de Olhos pode comprar ou vender

    No Ceará existe atualmente mais de 2.30 deficientes visuais inscritos na lista de espera para receber doações de córneas realizadas através do Banco de Olhos do Instituto dos Cegos do Estado. Neste ano o número de doadores em vida aumentou significativamente. Foram feitas até agora mais de cinco mil doações de córneas. No entanto, segundo o presidente da Sociedade de Assistência aos Cegos mantenedora do Banco de Olhos, Waldo Pessoa de Almeida, o grande problema se verifica com relação às famílias dos doadores, que se negam a avisar ao Banco ou mesmo se recusam a satisfazer a vontade do morto.
    Ele salientou que esta é uma prática muito comum no Ceará, o que significa que as pessoas não estão ainda conscientizadas o suficiente para perceberem que se trata de um ato de solidariedade que não acarreta nenhum problema, uma vez que a retirada somente ocorre depois de constatada a morte por um médico. "Não existe o perigo de ser efetivada a doação se a pessoa estiver aparentemente morta. Esta é uma situação impossível de ocorrer, pois temos o máximo de dado nestes casos", esclareceu Waldo Pessoa.

LEGISLAÇÃO
    O Banco de Olhos funciona basicamente em torno das doações de córneas. De acordo com a legislação vigente e pelo Código de Ética, nenhum Banco pode comprar ou vender. É por isso que na instituição não há faturamento algum e vive da colaboração de voluntários. Waldo Pessoa lembrou que o Banco funciona desde 1978 e um fato inusitado que está ocorrendo há quatro meses na Sociedade de Assistência aos Cegos é que em todas as últimas quintas-feiras de cada mês um grupo de pessoas que faz parte da lista de espera dos transplantes se reúne para discutir sobre o assunto, bem como receber explicações dos médicos.

INICIATIVA
    Atualmente participam cerca de 35 deficientes visuais. Durante as reuniões, além das orientações relativas à parte clínica, eles também são informados sobre as possibilidades de poderem voltar a enxergar normalmente, entre as muitas outras dúvidas. A novidade destes encontros fica por conta da decisão e disposição dos membros do grupo de procurarem pessoalmente um doador para cada um deles. Neste caso, quando um consegue um doador tem prioridade na realização do transplante, que somente pode ser feito de uma córnea por cirurgia. A outra córnea fica para o Banco, que imediatamente realiza outra cirurgia em outro paciente obedecendo rigorosamente a ordem cronológica da lista de espera.
    Segundo a atendente do Banco de Olhos, Leó Magalhães, lá existem duas destas listas. Uma delas é destinada exclusivamente para os casos de urgência em que o paciente corre o risco de não poder mais recuperar a visão. Geralmente são casos de glaucoma, úlcera de córnea, traumatismo perfurante, ceratone agudo, entre outros. "Aqui os mais comuns são mesmo os casos de úlcera de córnea", afirma Leó Magalhães.

CONSCIENTIZAÇÃO
    Para as pessoas que têm procurado o Banco de Olhos para oficializarem a doação dos olhos são feitos alguns esclarecimentos. O primeiro é no sentido de que eles conscientizem á família acerca da importância dá sua decisão, que deverá ser respeitada após a morte. Também deve ser esclarecido que, no máximo de quatro horas após o falecimento, o fato deverá ser comunicado ao Banco para que dentro deste período de tempo sejam retiradas as córneas. Deve deixar claro ainda, que com a operação, o doador não ficará deformado, uma vez que é utilizada uma técnica cirúrgica, que não deixa qualquer vestígio.
    Leó Magalhães ressalta que a córnea é o órgão humano que não tem limite de vida e as pessoas podem doar ainda que já o tenha recebido de outras. Também, esclarece: "É o único órgão que não pode ser retirado de pessoas vivas, mesmo que seja .somente de um olho". O início do processo para receber o transplante se dá a partir do momento em que o oftalmologista detecta a necessidade de o paciente se submeter à cirurgia e envia o diagnóstico para o Banco.
    Lá é feita a inscrição, bem como a entrega da requisição dos diversos exames que deverão Ser realizados, como o de glicemia, sumário de urina, dosagem de uréia, eletrocardiograma radiografia do tórax. De posse de todos esses exames o paciente passa a integrar a lista de espera dos transplantes. "A partir dai ele pode esperar a sua ver ou ir à luta atrás de um doador", ressalta Leó. Magalhães. Ela acrescentou que a procura dos receptores é grande e a ocorrência de fato das doações é bem inferior. Disse que neste ano somente foram realizadas 28 cirurgias, o que significa que foram retiradas as córneas de 14 pessoas.

ANSIEDADE
    No período anterior à cirurgia de transplante se verifica nos pacientes um aumento do grau de ansiedade. Leó observa que eles querem saber se vão mesmo enxergar, quanto tempo será necessário para a recuperação total da visão e se podem viajar para outras cidades. Também eles demonstram muita vontade de conhecer a família do doador para agradecer o desprendimento e a solidariedade.
    Independente de sexo e idade todas as pessoas podem doar suas córneas. Leó Magalhães contou que no mês de abril houve um caso de uma senhora de 92 anos de idade que doou, e as pessoas que receberam o transplante estão enxergando normalmente. Os casos em que é desaconselhável efetuar a retirada das córneas são aqueles em que o doador morre com doenças como viroses, tuberculose, hidrofobia, câncer, sífilis e AIDS. Quem estiver interessado em participar da campanha permanente de doação dos Olhos do Instituto dos Cegos, na Rua Padre Anchieta, 1400, esquina com a Av. Bezerra de Menezes. Também poderá somente comunicar sua decisão através do telefone 243.6111.


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