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Jornal O POVO
Quinta-feira - 11-08-2005

Fortaleza - Ceará - Brasil
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Buchicho
Muito além da visão


 

      Assim como Flor, personagem de Bruna Marquezine em "América", adolescentes cearenses superam os limites da deficiência visual, aprendem a escrever e a ler em Braile, estudam, tocam e fazem planos para o futuro. E se declaram fãs do Buchicho

Foto do Jornal O POVO

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JOSÉ VALMIR sonha em
integrar uma dupla sertaneja

      JOSÉ VALMIR, ITALO E NAYANE são fãs declarados do Buchicho. Assim como outros milhares de adolescentes, eles fazem de tudo para ler o caderno sempre que possível. A diferença é que os três são deficientes visuais. Exatamente como a personagem Flor, na novela América, eles não deixam que essa limitação física os impedisse de levar uma vida normal. Em entrevista ao Buchicho, eles revelam seus sonhos, paqueras, projetos e preferências musicais.

      Muitas vezes o ser humano impõe seus próprios limites, conformando-se em achar que não está apto ou simplesmente não consegue realizar certos tipos de atividades. Mas até onde vai a nossa capacidade de superar obstáculos? Até onde somos capazes de vencer limitações e levar uma vida comum? Difícil responder. A nós, ou a quem se considera normal, fica o papel de observar, aprender e admirar os exemplos que estão aí, por todos os lados.

      Uma rápida visita à Sociedade de Assistência aos Cegos (SAC) de Fortaleza é suficiente para mostrar que, assim como na novela "América", o mundo está cheio de crianças como a Flor (Bruna Marquezine), a Duda e o Gabrielzinho do Irajá. São garotos como outros quaisquer que, a despeito da deficiência visual, gostam de ler, correr, brincar, estudar, escrever, cantar, namorar... enfim, tudo o que você também curte.

      É o que mostra a jovem Nayane Karla Cavalcante Leitão, de 12 anos. Todos os dias, ela segue uma rotina comum de estudos e diversão. "Eu acordo, tomo banho e vou fazer minhas tarefas de casa. Depois do almoço vou ao colégio e, quando volto para casa, assisto a novelas e gosto de brincar de correr, pular e jogar bola com meus amigos, que não são deficientes visuais", conta.

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NAYANE KARLA: leitura do Buchicho
para acompanhar as previsões de
seu signo, Virgem

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      Em relação aos estudos, Nayane é um pouco diferente da maioria: Matemática é sua matéria preferida. "É bem mais fácil que História e Geografia. Estas eu não gosto". Sempre que tem tempo, ela não dispensa uma boa leitura. Livros de histórias e jornais, que a Associação imprime em Braille, também fazem parte de seu cotidiano. "Sempre que tenho tempo levo para ler em casa. Gosto muito do Buchicho, pois lá acompanho o horóscopo", revela a virginiana.

      Outro que está sempre ligado no Buchicho é Ítalo Guiterrez Pereira, 12 anos, conhecido como o contador de histórias do Instituto Hélio Góes, escola mantida pela SAC. "Leio muito o horóscopo, mas também curto as fofocas e acompanho os resumos das novelas. Aliás, eu só leio o jornal O Povo! Se não for ele, não presta! É uma questão de conteúdo", avalia.

      Ítalo ainda não decidiu o que quer ser quando crescer. Tem dúvidas entre a carreira de escritor, de cantor ou de atleta, entre tantas outras. Por enquanto, é na primeira que ele vem se destacando. Há algum tempo o garoto se dedica a seu primeiro livro, "O amor é belo", que explica como este sentimento pode mudar a vida das pessoas. A inspiração, alguém duvida de onde veio? "Não quero dizer o nome, mas ela é daqui da escola, sabe de tudo e corresponde", conta, todo orgulhoso. Mas Ítalo alerta para que as pessoas não se surpreendam, caso ele se torne um músico. Afinal, já domina o teclado e curte bandas como Evanescence, Linkin Park, Nirvana e Skank.

      A música também faz parte da vida de José Valmir Justino Bezerra, de 18 anos. Aos 7, decidiu aprender a tocar, ganhou um violão de presente do pai e nunca mais se separou do instrumento. Sua influência, a dupla Bruno & Marrone, deixa claro o caminho que deseja seguir. "Tô atrás de fazer uma dupla sertaneja", diz.

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ÍTALO: amor
correspondido

      Histórias como estas vêm sendo contadas todos os dias na novela "América", de Glória Perez. As excelentes atuações de Marcos Frota (Jatobá) e Bruna Marquezine (Flor), além da participação dos verdadeiros deficientes visuais Duda e Gabrielzinho do Irajá, vem fazendo com que o núcleo ganhe cada vez mais destaque na trama das 8, contribuindo para que a sociedade os veja de uma forma mais real. "É para acabar com o preconceito. Tem muita gente que pensa que não podemos fazer as mesmas coisas que eles", conta Nayane. "A novela ensina e mostra também ao governo algumas coisas de que nós precisamos, como sinais sonoros de trânsito", completa Ítalo, que se identifica bastante com Gabrielzinho.

      Para Cássia Aquino, professora do Instituto, "América" está desempenhando um papel muito importante na sociedade.

      "As pessoas estão mais curiosas e aumentou bastante o respeito em relação a eles. Parece que o nosso trabalho tomou proporções maiores e ficou ainda melhor".

      E as conquistas não param por aí. Este mês, a Universidade Federal do Ceará (UFC) colocou à disposição dos alunos deficientes visuais o serviço "Biblioteca digital", que consiste na adaptação do material didático utilizado nas disciplinas, permitindo o acesso ao conteúdo dos textos. Funciona da seguinte maneira: o estudante leva o livro para ser digitalizado e gravado em um CD, que poderá ser lido através de sistemas especiais como o Dosvox. Segundo Andréa Sampaio de Lima, vice-coordenadora do projeto, é uma excelente forma de levar a discussão sobre inclusão para a Universidade. "Estamos permitindo que estas pessoas tenham acesso à informação e, em contrapartida, aprendendo a lidar com a diversidade. Isso é o que se chama, verdadeiramente, de inclusão".


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