SOCIEDADE DE ASSISTÊNCIA AOS CEGOS
60 ANOS
Ensinando a Ver o Mundo
Blanchard Girão
Páginas: 156-157


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A BOA FADA

     Dizem, e eu acredito, que desponta sempre uma fada no destino das pessoas e das instituições. No seu andar lento, mas seguro, a escola, então já ostentando a denominação atual de Instituto dos Cegos, alcançou a segunda década de funcionamento, nos anos 50. A sede da entidade, seu internato-albergue e sua escola, funcionavam inteiramente no prédio da Bezerra de Menezes, hoje apenas a sede social e o auditório. Pela rua transversal anterior, a Padre Anchieta, precisamente no local em que agora se ergue o grande conjunto de consultórios denominado Unidade Oftalmológica Ieda Baquit, departamento da mais alta relevância da estrutura da SAC, vivia com o marido Dona Rivalda Sales de Sales, uma mulher simples e generosa, que acompanhava com profundo interesse o trabalho desenvolvido pela SAC. Ferindo a sua modéstia, que divisei na oportunidade de conversar com ela sobre o Instituto dos Cegos, vou reservar-lhe algumas linhas deste capítulo, em louvor aos esforços que cumpriu na sua vinculação com aquela casa.
     Foi por aí, em 55 muito provavelmente, que Dona Rivalda, a vizinha, encarou a condição de servidora de fato e de direito do Instituto. Antes, voluntariamente, dava aqui e ali uma mãozinha quando se fazia necessário. Mas agora era mesmo pra valer, cumprindo expediente... bom. Não é bem assim. Não havia essa história de relógio de ponto, de hora pra entrar e para sair. Na verdade, era a toda e qualquer hora a serviço, com amor, daquela casa e àquela gente. Tornou-se uma espécie de secretária. Mas era uma secretária múltipla: secretária da escola, secretária da diretoria, secretária do Dr. Hélio. Deste, principalmente. Com ele sustentava alegre queda-de-braço, saindo vitoriosa quase sempre dessas teimas duras travadas com o grande baluarte da instituição. Ele acabava concordando e, feliz, deixava Rivalda fazer conforme seu bom senso, sua intuição feminina e sua devoção ditavam.
     Além dessa função, Dona Rivalda também ensinava no 4º ano primário, turma mais adiantada da escola, absorvendo, para tanto, a metodologia do ensino especial ali praticado.
     As diretoras se sucediam – Glafira Bonfim fora a primeira, depois vieram D. Lúcia Oliveira Barbosa, D. Italvina Marly Góes Sampaio, D. Rosa Maria Góes Sampaio, D. Maria Neuza Fonteles Rocha e Dona Maria Duci. Mas todas elas encontravam em D. Rivalda a mais assídua e eficiente colaboradora. Talvez pelo fato de morar ao lado, tinha na escola uma espécie de prolongamento do seu território doméstico. Vivia lá a maior parte de suas horas. Ou, então, na rua, batalhando por alguma coisa que se fazia indispensável. Se faltava merenda escolar, lá ia Rivalda bater à porta da LBA, ou do INSS, ou ainda da Caritas, Associação da Arquidiocese. Às vezes, se era exigido um documento indispensável ao recebimento de dotações públicas, Dr. Hélio não confiava a missão a ninguém senão a Dona Rivalda. Era o "faz-tudo" da escola, a fada madrinha, religiosamente entregue àquela salutar missão.
     Professores e alunos tinham por ela afeição igual à que devotavam a outra benemérita da SAC, Dona Maria Prata, que cuidava maternalmente do pesado trabalho gerencial do internato.
     D. Rivalda Sales de Sales (que poderia ter um terceiro Sales acrescido ao nome), porquanto prima em segundo grau do grande poeta e romancista cearense Antônio Sales, que por um quase nada não casou com sua avó, serviu abnegadamente ao Instituto dos Cegos, por longos 30 anos.
     Quando a Sociedade precisou da área de sua casinha, tratou depressa de conseguir uma bem próxima (é só atravessar a avenida, explica), de maneira a não sair da vizinhança.
     A Sociedade sempre deu muita sorte com os vizinhos, citando-se, além de D. Rivalda Sales e Sales, o general Torres de Melo, que comandava o CPOR, quartel pertinho, aí pelos anos sessenta e tornou-se um colaborador apaixonado da causa dos deficientes visuais cearenses. Vizinhos também eram os Alcântara, Dr. Waldemar, homem influente – deputado, senador, governador e o mais que fosse – Dona Dolores, e o filho Lúcio, que desde muito moço se incorporou ao trabalho de instituição, na qual o pai ilustre exerceu as mais variadas funções, inclusive a presidência. Lúcio não faltava solenidade, comparecia a muitas sessões, e quando também fez sua carreira política não esqueceu a velha casa, fronteiriça à sua, que se acostumou a admirar desde a meninice.
     Mesmo com todo o vulto do seu trabalho, Dona Rivalda nunca aceitou a direção da escola, argumentando que, por não ser registrada como tal, não deveria ocupar uma função própria daquelas que se prepararam para esse mister.
     Assumiu papel decisivo no esforço, já então contando com a colaboração de Dona Josélia, atual presidente, para organizar a estrutura legal da SAC, a partir do ordenamento da documentação esparsa que o Dr. Hélio Góes guardava zelosamente em seu birô.

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